sábado, 20 de fevereiro de 2016

Pavimentando mentiras e requentando promessas

Recentemente a Prefeitura Municipal de Salgueiro publicou na sua página virtual do seu perfil institucional de uma rede social, certa imagem que retratava a Comunidade de Conceição das Crioulas vista do alto e uns dizeres relacionados a uma possível conquista da pavimentação da estrada (rodovia PE-470) que dá acesso a inúmeras comunidades da zona rural, entre elas duas comunidades de povos tradicionais que ajudaram a dar origem ao nosso município. A já citada comunidade quilombola de Conceição das Crioulas e a aldeia do povo indígena Atikum Umã, na comunidade de Poço da Pedra.


Foto publicada no perfil institucional da Prefeitura de Salgueiro
em uma rede social, que de modo eleitoreiro alega que a solicitação
para pavimentação da PE-470 foi atendida por Paulo Câmara,
a pedido do prefeito e da ex-prefeita. Esquecem de dizer que há anos
esta mesma promessa é repetida antes das eleições.


O grande "feito" é atribuído ao grupo instalado há aproximadamente 16 anos (isso mesmo, mais de uma década e meia) no Poder Executivo Municipal, mas a menção não se trata de algo institucional, público ou governamental, pelo contrário, é bem clara quanto ao personalismo característico da “política” nas cidades sertanejas e interioranas do nosso estado. A publicação com tamanho teor de personificação só não é mais extrema porque não apresenta as imagens das pessoas nominadas.

O prefeito Marcones Sá e a ex-prefeita Creuza Pereira, ambos sendo as duas pessoas citadas com responsáveis pelo “feito” da pavimentação da estrada que liga Conceição das Crioulas a BR-116, também colocavam o nome de um terceiro gestor que talvez nem conheça a realidade secular de luta, bravura e resistência das mulheres negras que chegaram ao antigo quilombo e fundaram a Comunidade de Conceição das Crioulas. Como que uma espécie de triunvirato, as três pessoas salvadoras do acesso ao povoado eram apresentadas como as responsáveis por algo que não existe. Apenas existe na esperança daquele povo através das reiteradas promessas. Creuza, Marcones e Paulo Câmara não sabem, ou esqueceram, ou fingem não saber, que em 2013 algumas outras lideranças e correligionárias da sua própria sigla estiveram andando por Salgueiro para realizar mais promessas e pavimentar não a PE-470, mas a ainda “esboçável”, mas irreversível, pré-candidatura do ex-governador Eduardo Campos ao Palácio do Planalto.

Agora vamos aos acontecimentos para comprovar que o PSB em quase 16 anos não conseguiu cumprir a promessa antiga e ainda hoje, por mais uma vez em período pré-eleitoral, explora o assunto e se disfarça de grande feitor do que ainda sequer existe, com o único propósito de novamente ludibriar a população daquele território rural e angariar talvez alguns votos para a próxima eleição no segundo semestre. Só para não cair no esquecimento, reforço aqui os nomes que já pisaram em Conceição das Crioulas prometendo mundos e fundos, em especial, a tão sonhada pavimentação. São estes, todos do PSB: Ranilson Ramos, Aldo Guedes, Eduardo Campos, Isaltino Nascimento, Marcones Sá, Creuza Pereira. Gostaria de lembrar ainda que em julho de 2013 o então govenador do Estado apareceu pelas bandas de cá para cumprir agenda, acompanhado do seu secretariado, entre eles o secretário de Transportes, Isaltino Nascimento. Na mesma manhã que em que Eduardo Campos e Isaltino Nascimento assinavam a ordem de serviço para de restauração da PE-507, em Serrita, a população rural e quilombola, além das pessoas que residiam no entorno de Conceição das Crioulas, interditavam o trecho da BR-116, próximo a Serra do Boi Morto, para cobrar das autoridades presentes no Sertão Central, que a PE-470 fosse finalmente entendida como importante e estratégica para elevar a qualidade de vida daquele povo inteiro. Interpelado ao vivo durante um programa de rádio, Eduardo Campos e Isaltino Nascimento prontamente deram retorno positivo e garantiram que a pavimentação da rodovia em questão sairia do papel.

Estamos em 2016, mais um ano eleitoral. A pré-candidatura do PSB par ao pleito de 2014 até saiu do lugar, mas não houve muito êxito e faço questão de não delongar sobre esses detalhes funestos, mas o interessante é que justamente em 2016, novamente, o PSB através da sua gestão na Prefeitura Municipal de Salgueiro e das figuras já personificadas (Marcones, Paulo Câmara e Creuza Pereira) prometem mais uma vez e, pior, publicizaram a promessa em meio institucional por meio de uma publicação em página virtual, constando inclusive o nome da ex-prefeita Creuza Pereira.

Gostaria de tecer algumas perguntas, não serão mais que três. Mas, não se preocupem, não perguntarei de quem é o jatinho e nem se o ri Capibaribe mudou de curso, já que os dois personagens das factícias artimanhas não tiveram e ainda não têm mais nada a contribuir neste caso.

1.    A população que sofre naquela estrada todos os dias ainda vai dar créditos a estas falácias eleitoreiras do PSB mais uma vez?
2.    O PSB e a gestão municipal precisam mesmo alardear falsamente como se fosse alguma novidade a falta de capacidade de não tratar de maneira requentada, assim como tantas outras, uma causa popular tão nobre?
3.    Essa tentativa de tirar o peso dessa reivindicação das costas do povo da zona rural daquele distrito, custará mais quantos anos de promessas vazias e enrolação?

Vamos conferir abaixo as imagens, os links dos blogs regionais e constatar a repetitiva falácia do PSB em relação a pavimentação da PE-470.



- Salgueiro firma convênios com o Governo do Estado para a zona rural (este convênio não foi cumprido, quem quiser comprovar pode ir até Conceição das Crioulas e verá mais uma promessa não cumprida)





Ranilson Ramos e Aldo Santos, em 2013, assinando convênio que
até hoje não passou de mais do mesmo: promessas para tentar garantir
aqueles votos ao presidenciável do PSB nas eleições de 2014.

- A Comunidade de Conceição das Crioulas entrega documento com reivindicações a representante do Governo do Estado (esta promessa também se revelou mentirosa rapidinho, pois dos oito pontos reivindicados, nem metade foi cumprida)

Na foto, Andrelino Mendes, representando a comunidade no momento
da entrega 
da pauta de reivindicações a Ranilson Ramos e Aldo Santos, 
secretários do governo Eduardo Campos em 2013.

Liderança feminina na Comunidade de Conceição das Crioulas,
a artesã Lurdinha expôs os problemas e também cobrou soluções para
as reivindicações apresentadas pela população que reside naquele distrito. 



- PROTESTO: Moradores interditam BR-116 e fazem cobranças a Eduardo Campos. (essa promessa feita pelo próprio ex-governador, regente maior naquela época)


http://faroldenoticias.com.br/protesto-moradores-interditam-br-116-e-fazem-cobrancas-a-eduardo-campos/

Moradores da zona rural durante o protesto que interditou um trecho
da BR-116 para cobrar a pavimentação da rodovia estadual PE-470.

- Moradores de Conceição das Crioulas bloqueiam BR-116. (o pedido da pavimentação não é de hoje, mas a promessa voltou à tona quando a eleição se aproximava)





Trecho da BR-116 interditada em julho de 2013 para cobrar ao então
governador Eduardo Campos e Secretário Estadual de Transportes da época,
Isaltino Nascimento, a pavimentação da rodovia estadual PE-470.


- Eduardo Campos se depara com manifestações em Salgueiro e Serrita (naquele momento em que o presidenciável não pode se expor negativamente aos desgastes de manifestações populares por melhorias, nada poderia sair errado, exceto a nova promessa para o mesmo reclame da população)






"Quem não te conhece, que tem compre", já dizia minha vó.

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Marilena Chauí errou em atacar a classe média

(Elenco original de A Grande Família, um símbolo da classe média brasileira. Foto: divulgação)

Aquele vídeo em que a Marilena Chaui, intelectual que respeito, ataca a classe média, sempre me deixou incomodada. Poxa, eu sou de classe média! Compreendo, claro, que ela se referia, mais que à classe média, ao pensamento médio, tacanho, mesquinho, egoísta. Ainda assim, foi como se ela estivesse me atacando pessoalmente. Sinto de forma parecida quando criticam o Lula e percebo que, por trás dos ataques, se esconde um enorme preconceito de classe e de origem, por Lula ser nordestino e de família humilde. Isso me atinge, porque, além de tudo, eu também tenho origem simples e sou nordestina.

É duro, para uma pessoa de classe média, ouvir uma intelectual de esquerda dizer que a odeia, que a acha “uma abominação política porque fascista, uma abominação ética porque violenta, e uma abominação cognitiva porque ignorante” —sobretudo quando não se é nada disso. Soa pior ainda quando vemos que tem a seu lado, no palco da palestra em questão, um ex-presidente que se gaba (e é verdade) de ter possibilitado a ascensão dos pobres à… classe média!

Essa crítica tão feroz à classe média, que me perdoe a Marilena Chaui, me parece elitista, uma velha contradição da esquerda intelectual no Brasil. Um certo esnobismo, complexo de superioridade. Me lembra aquele personagem de Terra em Transe, de Glauber Rocha, gritando a todos pulmões que o povo é débil mental. Não acredito que faça bem nenhum à imagem da esquerda este tipo de postura, pelo contrário. O vídeo de Marilena Chaui virou um clássico da direita contra a esquerda na internet, popularizado em memes e edições grotescas.

Do ponto de vista estratégico, o ataque da filósofa petista é um desastre. Atiçou a turba sem necessidade, ajudou a desatar a ira da classe média sobre a esquerda (como se não bastasse a mídia…). Principalmente porque sabemos que na hora agá, em ano eleitoral, o PT gasta milhões com marqueteiros para atrair justamente a classe média —com doações dos banqueiros que, aliás, ele NÃO critica. Taí, eu simplesmente não consigo entender uma esquerda que poupa os banqueiros e detona a classe média. E sejamos francos: se quem vai às ruas atacar a esquerda é de classe média, também o é boa parte de quem se manifesta para defendê-la.

Auto-denominado “socialista democrático” e com sérias chances de vencer a disputa na pátria do capitalismo, os EUA, o pré-candidato à presidência Bernie Sanders tem tentado uma estratégia oposta, a de seduzir a classe média para o que pretende. Porque lá o sonho americano está se desfazendo e a principal vítima é a classe média. É a classe média norte-americana quem está sedenta por mudança e que é capaz de enxergar que o “outro mundo é possível” pode ser experimentado na terra de Ronald Reagan. Bernie faz promessas diretas para a classe média, de que o modelo que propõe vai ajudá-la a recuperar seu poder aquisitivo.

“A grande classe média norte-americana está desaparecendo”, Sanders costuma lembrar nos comícios, apontando para o tão acalentado “american dream”, que se esfuma diante dos olhos da nação. O sonho americano acabou?, perguntam-se articulistas atônitos em publicações liberais e conservadoras, confrontados com indicadores que mostram o empobrecimento da população e a desigualdade crescente. Que dor maior seria possível, para o americano médio, do que admitir que o sonho acabou?

Em seu discurso vitorioso na convenção em New Hampshire, Bernie novamente acenou à falida classe média do país. “A ganância, a imprudência e o comportamento ilegal de Wall Street levaram a nossa economia a ficar de joelhos. O povo americano socorreu Wall Street, agora é a hora de Wall Street ajudar a classe média”. A promessa de que haverá saúde gratuita universal (além de universidade gratuita) ajuda a conquistar a classe média também pelo bolso, porque significará uma economia no orçamento apertado de gente que precisa ter até três empregos para ganhar a vida.

O discurso de Bernie Sanders mostra que a classe média pode ser despertada para uma visão progressista do mundo, em lugar de desprezada. Mas é preciso detectar o que ela deseja. Melhor: é preciso convencê-la de que o que ela deseja de verdade em sua vida é algo muito mais profundo do que um novo smartphone ou televisão de plasma. Nos EUA, a classe média está decaindo, e por isso este interesse pelo socialismo de Sanders, pela outra via. No Brasil, a classe média subiu pelo consumo, mas este apoio ao PT pelo consumo se mostrou volátil, superficial, não duradouro além da eleição. Estamos vendo isto com toda clareza neste momento.

Em vez de pensar em um discurso mais abrangente e sedutor, no sentido de mostrar ser possível um lugar melhor para viver para a maioria das pessoas, a esquerda brasileira repete o mesmo comportamento de Hugo Chávez na Venezuela, espantando a classe média como um todo ao invés de tentar ganhar pelo discurso ao menos parte significativa dela —uma pena, este foi o grande equívoco do comandante. Desculpa, mas para mim o real inimigo nunca foi a classe média e sim a burguesia; as classes altas; os especuladores; as “elites” de que falava Lula; o 1%. É exatamente quem Bernie Sanders tem atacado, com sucesso.

Se um partido fracassou em conscientizar politicamente a classe média, não me parece justo culpá-la por sua falta de politização.


Fonte: Blog Socialista Morena